SAiu “MIRROR SONGS” TRIBUTO DA LUX RECOrDS A PSYCHEDeLIC FURS
Tens dezassete anos e a tua futura namorada aparece com o álbum Mirror Moves (1984) debaixo do braço. A capa fixa-te a atenção, mas é o nome da banda que te conquista: The Psychedelic Furs. Uns dias depois ouves no “Som da Frente” a voz do António Sérgio a apresentar um especial “Lista Rebelde – Vozes Masculinas”: no sexto lugar aparece Richard Butler e o tema escolhido para o ilustrar é “The Ghost In You” (o tema de abertura de Mirror Moves). Pedes o disco emprestado à futura namorada, mas no fundo era mais um pretexto para estar em contacto com ela, e ouvir o disco vezes sem conta. Entretanto, o teu amigo Rui Miguel Abreu grava-te para cassete, os álbuns Talk Talk Talk (1981) e Forever Now (1982), e não demorou muito para que adquirisses o disco de estreia The Psychedelic Furs (1980). Em pouco tempo, a banda de Richard Butler, Tim Butler, John Ashton, Vince Ely, Roger Morris e Duncan Kilburn torna-se no teu grupo fetiche.
Passas a colecionar todos os discos dos Furs nos vários formatos, e a ansiar por novos lançamentos. Em 1986, surge a regravação de “Pretty In Pink” para a banda sonora do filme de John Hughes com o mesmo nome, e no ano seguinte o novo disco de originais Midnight to Midnight.
Midnight To Midnight era um disco virado para o mercado americano, e a escolha do produtor Chris Kimsey (The Rolling Stones, Killing Joke, Marillion) era a prova que a banda queria atingir novos públicos e capitalizar o sucesso de “Pretty In Pink”. Mesmo assim e apesar do saxofone de Mars Williams, aos dezanove anos devoras canções como “Heartbreak Beat”, “Angels Don’t Cry” e “All Of The Law”,
Desde Mirror Moves que a banda ficou reduzida ao núcleo Richard Butler, Tim Butler e John Ashton, mas o ano de 1988 marcou o regresso do baterista Vince Ely para gravar o single “All That Money Wants”.
“All That Money Wants” seria o único original incluído na compilação All Of This And Nothing, por sinal o nome da tua canção preferida de “Talk Talk Talk”. Foi o trampolim para um novo álbum, editado em 1989, com o título Book Of Days e a produção de David M. Allen (The Cure, Sisters Of Mercy, Chameleons, Wire). O disco mais negro dos Furs, denso e cáustico, um álbum quase shoegaze, mesmo antes do estilo ser inventado. Ainda assim, encerrava pérolas como “Should God Forget”, “House”, “Entertain Me” e “Torch”.
Vince Ely ainda faz a digressão de Book Of Days mas volta a abandonar em 1990 e já não participa nas gravações de World Outside. O sétimo álbum de originais dos Psychedelic Furs contou com Stephen Street (The Smiths, Morrissey, Triffids, Sandie Shaw, Blur) na produção, e foi editado no dia 1 de Julho de 1991. World Outside é um disco sólido, pessimista, e onde de todas as fantasias, se prefere a realidade, as pessoas e as relações, naquilo que têm de mais aflitivo, tentador e drástico.
Poucos meses depois, os The Psychedelic Furs apresentam-se ao vivo em Portugal para promoverem World Outside. São dois concertos, no Cinema Vale Formoso no Porto (20 de Setembro) e no Coliseu dos Recreios em Lisboa (21 de Setembro).
Tens 21 anos e a tua namorada está sentada no comboio ao teu lado, numa viagem Coimbra/Lisboa para o teu primeiro concerto de um artista internacional. O destino é o Coliseu dos Recreios para ver ao vivo a tua banda de eleição, The Psychedelic Furs. As portas abrem às 20h30 e entras cedo para não perder pitada. Às 21h15 começam a tocar os Ritual Tejo. Abrem com “Ânsia”, e as melhores canções são duas ‘covers’: “Foram Cardos, Foram Prosas”, tema que Ricardo Camacho e Miguel Esteves Cardoso escreveram para a voz de Manuela Moura Guedes, e “Saudade” dos Heróis do Mar.
Às 22h30, com pontualidade britânica, os Furs entram em palco e atacam com “You & I” do álbum Forever Now. Seguem-se “Dumb Waiters” (Talk Talk Talk) e “Here Come Cowboys” (Mirror Moves). Richard Butler, o seu irmão Tim e John Ashton trazem a lição estudada e sabem ao que vêm. Vêm promover o novo disco World Outside, e por isso, duma assentada apresentam “In My Head”, os singles “Don’t Be A Girl” e “Until She Comes”, e ainda o lindíssimo “Get A Room”. As canções novas estão bem oleadas porque em palco, o trio nuclear dos Furs faz-se acompanhar pelos músicos que gravaram o disco: o baterista Don Yallech, o teclista Joe McGinty e o multi-instrumentista Knox Chandler.
Depois de quatro canções novas, a banda segura a multidão que enche o Coliseu dos Recreios com mais três clássicos: o emblemático “Pretty In PinK” (Talk Talk Talk), “Run Run Run” e um dos momentos altos do concerto ao som de “Love My Way” (ambas de Forever Now).
Depois, nova incursão ao novo disco com “There’s A World”, “Sometimes” e “Better Days”. Richard Butler e companhia não deixam que os ânimos arrefeçam e lançam-se a dois singles de sucesso retirados de Mirror Moves – “Heaven” e “The Ghost In You”.
O concerto termina pelas 23h50, com dois temas de Forever Now, uma portentosa versão de “Sleep Comes Down” e um enérgico “Forever Now”.
É Sábado, e o último comboio para o regresso a Coimbra é às 00h10 na Estação de Santa Apolónia. O público não pára de bater palmas e exige o regresso dos The Psychedelic Furs. Entre palmas e gritos consegues convencer a namorada a ficar mais um pouco. Já percebeste que vão perder o comboio, mas foi isto que durante anos ansiaste e sonhaste. Depois de um concerto irrepreensível de 17 canções, como não ficar para o “encore”?
Mas valeu a pena, os Furs regressam para mais três canções: “Easy Street” (Forever Now), “Mr. Jones” (Talk Talk Talk) e “President Gas” (Forever Now). É meia-noite e quinze, o comboio já partiu, mas a multidão pede mais. Richard Butler, Tim Butler e John Ashton estão felizes e lisonjeados e regressam para um 2º ‘encore’, com uma canção de Mirror Moves, um surpreendente “Highwire Days”. O espectáculo termina às 00h21, tens aquela sensação estranha de ter presenciado um momento único que te vai marcar para sempre e, ao mesmo tempo, a impressão de que foste longe demais. A vida é feita de escolhas, às vezes escolhas difíceis. Terem que passar a noite ao relento à porta da estação de Santa Apolónia e nem sempre com a melhor vizinhança, parecia-te agora algo altamente irresponsável.
A digressão de World Outside durou até final de 1992, e depois os The Psychedelic Furs encerraram actividades. Os irmãos Butler formaram os Love Spit Love e editaram dois álbuns: Love Spit Love em 1994 e Trysome Eatone em 1997. Pelo meio gravaram uma bela versão de “How Soon Is Now?” dos The Smiths para a banda sonora do filme “Crazy” (1996). Os Love Spit Love não vingaram e os Furs voltam a reunir-se em 2000 para uma longa digressão.
Em 2010 regressam a Portugal para dois concertos em Lisboa (Coliseu dos Recreios) e no Porto (Teatro Sá da Bandeira), nos dias 19 e 20 de Outubro, para tocar na íntegra o genial álbum de 1981 Talk Talk Talk. Desta vez assistes ao concerto do Porto, ouves clássicos como “Pretty In Pink”, “Dumb Waiters”, “Mr. Jones”, “Into You Like A Train” e “All Of This And Nothing”, mas com o saxofone de Mars Williams, e sentes que falta o toque de Duncan Kilburn.
Passaram quase vinte anos sobre a primeira passagem dos The Psychedelic Furs por Portugal e tens agora no currículo muitas centenas de concertos. Já não procuras autógrafos como no início, mas a namorada convence-te a esperar pelos músicos para te assinar o bilhete e ficam incrédulos quando lhes dizes que tens centena e meia de discos dos Furs.
Regressaram ainda em 2017, ao Festival Vilar de Mouros, mas estás em Espanha com os D3O para o Free Rider Festival.
Em 2019, nova visita dos Furs a Portugal para concertos no Porto (15 de Outubro no Hard Club) e Lisboa (16 de Outubro no Lisboa Ao Vivo).
O concerto do Porto coincidiu com o aniversário do Zé Miguel, amigo de longa data e fã incondicional dos The Psychedelic Furs. Para celebrar o aniversário saiu de Coimbra um autocarro com cerca de 30 pessoas com destino ao Hard Club. Primeiro concerto em Portugal sem John Ashton, o novo guitarrista de serviço chama-se Rich Good. Para além dos irmãos Butler, em palco estavam ainda Paul Garisto (já tinha gravado o álbum Midnight To Midnight) na bateria, Amanda Kramer nos teclados e Mars Williams no saxofone. Mas houve um convidado especial na segunda guitarra, um dos guitarristas fundadores da banda: Roger Morris.
Foi um concerto memorável e com uma nova canção, “The Boy Who Invented Rock & Roll”. Em Julho de 2020, “The Boy Who Invented Rock & Roll” abriria o álbum Made Of Rain, vinte nove anos depois de World Outside um grande regresso aos discos de originais.
Finalmente, em 2024 mais uma visita a Portugal e desta vez em Coimbra, no Luna Fest.
Início prometedor com “The Boy Who Invented Rock & Roll” seguido de “So Run Down” (Talk Talk Talk) e depois “The Ghost In You” (Mirror Moves) já com várias falhas no sistema sonoro. Os problemas técnicos inviabilizaram o resto do concerto dos Furs e logo na cidade que lhes preparava este tributo: Mirror Songs – A Tribute To The Psychedelic Furs.